A Mongeral Aegon Seguros e Previdência S.A.
foi condenada a pagar o capital estipulado na apólice à beneficiária de
um segurado que cometeu suicídio seis meses após a contratação do
seguro. A Seguradora havia se negado a pagar a indenização com base no
art. 798 do Código Civil, que dispõe: "O
beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se
suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente".
Essa
decisão da 10.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por
unanimidade de votos, reformou a sentença do Juízo da 10.ª Vara Cível do
Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba que julgou
improcedente o pedido formulado por D.A.V.S. (beneficiária do segurado) na ação de cobrança de seguro ajuizada contra a Mongeral Aegon Seguros e Previdência S.A.
Os
julgadores de 2.º, que reconheceram o direito da beneficiária do
segurado ao recebimento da indenização, assinalaram que "a
jurisprudência já consolidou entendimento no sentido de que a seguradora
obriga-se a efetuar o pagamento da indenização quando a morte do
segurado ocorrer por suicídio, salvo se comprovar ser premeditado, antes
ou ao tempo da contratação".
No
recurso de apelação, D.A.V.S. requereu a procedência da ação para que a
ré (Seguradora) seja condenada a pagar o valor segurado devidamente
atualizado.
O relator do recurso, desembargador Nilson Mizuta,
consignou em seu voto: "O falecimento do segurado foi em decorrência de
suicídio e a negativa da seguradora baseou-se no fato de que existe a
carência de dois anos prevista no art. 798 do Código Civil, que a isenta
da obrigação de indenizar".
"A
carência deve ser analisada com cautela. A positivação dos princípios
que informam a matéria contratual, já no início da regulação dos
contratos elencados, quais sejam, a função social e a boa-fé objetiva
(arts. 421 e 422 do Código Civil), implica na interpretação de todos os
demais dispositivos referentes ao mesmo tema em conformidade com eles."
"Assim,
o art. 798 não poderia ter uma interpretação limitada a seu significado
literal. Ao contrário, deve veicular uma norma que esteja de acordo com
a axiologia que conforma o ordenamento jurídico."
"A
jurisprudência já consolidou entendimento no sentido de que a
seguradora obriga-se a efetuar o pagamento da indenização quando a morte
do segurado ocorrer por suicídio, salvo se comprovar ser premeditado,
antes ou ao tempo da contratação."
"Nesse sentido, foram editadas as Súmulas 105 do STF e 61 do STJ, verbis: Súm. 105, STF: ‘Salvo
se tiver havido premeditação, o suicídio do segurado, no período
contratual de carência, não exime o segurador do pagamento do seguro'. Súm. 61, STJ: ‘O seguro de vida cobre o suicídio não premeditado'."
"Esse
entendimento é amparado nos estudos científicos a respeito do suicídio,
ou seja, de que, via de regra, esse ato é praticado de forma
inconsciente pelo agente."
"Com efeito, consoante ensina OLAVO DE ANDRADE, o suicídio ‘presume-se
sempre como ato de inconsciência, cabendo a quem tiver interesse provar
ao contrário, de modo a destruir tal presunção' (citado por José Augusto Delgado, in Comentários ao Novo Código Civil, vol. XI, tomo I, Ed. Forense, p. 788)."
"Todavia,
com o advento do Código Civil de 2002, foi positivada norma pela qual a
cobertura seria indevida se o suicídio ocorrer antes de 02 (dois) anos
contados da vigência da apólice, verbis: ‘Art.
798 - O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o
segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do
contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto
no parágrafo único do artigo antecedente'."
‘A
questão que surge desse dispositivo é se todo e qualquer suicídio
praticado dentro do biênio tem o condão de excluir o dever de cobertura.
A resposta, a meu ver, é negativa, sob pena de ser desconsiderado todo o
estudo científico a respeito do suicídio."
"Noutras
palavras, respeitando-se os entendimentos em sentido contrário, é
impossível presumir premeditação tão-somente porque o sinistro ocorreu
dentro de determinado prazo. Aliás, esse entendimento colide
frontalmente com um dos princípios de nosso ordenamento jurídico, qual
seja da boa-fé. No caso, estar-se-á presumindo a má-fé do segurado."
"Em relação à boa-fé, já se decidiu: ‘Considerando
que o contrato de seguro é contrato de adesão, eventuais dúvidas
resolvem-se em favor do segurado, consumidor do serviço, cuja boa-fé é
presumida' (TJPR - 9ª C.Cível – AC 0690215-0 – Cascavel - Rel.: Juiz Subst. 2º G. Antonio Ivair Reinaldin - Unânime - J. 19.08.2010). ‘A boa-fé do segurado é presumida, devendo a seguradora comprovar alegada má-fé no momento da contratação' (TJPR - 10ª C.Cível - AC 0470780-2 - Rio Negro - Rel.: Des. Marcos de Luca Fanchin - Unânime - J. 28.08.2008)."
"No
caso em apreço, como a seguradora sequer alegou a existência de
premeditação e inexiste qualquer indício de prova nesse sentido, a
cobertura é devida."
"Dessa
forma, procede o pedido inicial, sendo devida a indenização nos termos
da apólice contratada, devendo incidir correção monetária a partir da
data do sinistro e juros de mora de 1% ao mês, a partir da data da
negativa da seguradora até a data do efetivo pagamento."
(Apelação Cível n.º 845158-9)