Os juros de mora, nos casos de condenação por dano moral, incidem a partir da data do evento danoso. A decisão é da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou recurso da Empresa Folha da Manhã S/A, condenada a pagar indenização por dano moral ao jornalista Marcelo Fagá (morto em 2003). Com isso, a Segunda Seção manteve o entendimento que já prevalecia no STJ – cuja revisão, ante as peculiaridades do caso, era defendida por parte dos ministros.
A questão começou quando o jornal Folha de S. Paulo publicou reportagem envolvendo o nome do jornalista em supostas irregularidades ocorridas no período em que trabalhou na assessoria de imprensa da prefeitura de São Paulo, durante o governo Celso Pitta.
Na matéria, publicada em março de 1999, o jornalista teve o salário revelado e seu nome figurou numa lista intitulada “Os homens de Pitta”. Além disso, apareceu em textos que falavam sobre “máfia da propina”, “uso da máquina” e “cota de Nicéa Pitta” (referência a cargos preenchidos por indicação da mulher do então prefeito).
Em primeira instância, a ação foi julgada improcedente, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reformou a sentença, determinando a indenização por danos morais no valor de 200 salários mínimos, com juros de mora contados desde a data do fato.
Sem defesa
Segundo o TJSP, o jornal não se limitou a descrever os fatos noticiados, passando a adjetivar os envolvidos e manipulando, com as técnicas de imprensa, o pensamento de seus leitores. Inclusive teceu conclusão com o veredicto condenatório, sem dar ao jornalista nenhuma oportunidade de defesa. O tribunal estadual também levou em consideração a ausência de qualquer prova quanto ao envolvimento do jornalista nas acusações noticiadas.
A Empresa Folha da Manhã, que edita o jornal, não contestou o dever de indenizar nem o valor fixado, tendo feito, inclusive, o depósito em juízo. A empresa recorreu ao STJ apenas contra o termo inicial dos juros moratórios, alegando que, de acordo com o artigo 407 do Código Civil, "os juros de mora devem ser contados a partir do momento em que se tornou líquida a obrigação da requerente em indenizar, ou seja, no momento em que foi proferida a sentença".
A relatora do caso, ministra Isabel Gallotti, votou no sentido de que a fluência dos juros moratórios deveria começar na data do trânsito em julgado da condenação. Segundo ela, a questão do termo inicial dos juros de mora no pagamento de indenização por dano moral deveria ser reexaminada, tendo em vista as peculiaridades desse tipo de indenização. A relatora foi acompanhada pelos ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Raul Araújo.
Porém, o ministro Sidnei Beneti iniciou a divergência, no que foi acompanhado pela ministra Nancy Andrighi e pelos ministros Luis Felipe Salomão, Paulo de Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva. Assim, a relatora ficou vencida.
Segurança jurídica
Para o ministro Sidnei Beneti, o acórdão do TJSP está em conformidade com o entendimento do STJ, no sentido de que os juros moratórios incidem desde a data do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual (Súmula 54/STJ).
“Assim, diante de súmula deste Tribunal, a própria segurança jurídica, pela qual clama toda a sociedade brasileira, vem antes em prol da manutenção da orientação há tanto tempo firmada do que de sua alteração”, acrescentou.
A ministra Isabel Gallotti, ao apresentar ratificação de voto após o início da divergência, esclareceu que não estava contradizendo a Súmula 54. Especificamente no caso de dano moral puro, que não tem base de cálculo, ela aplicava por analogia a Súmula 362, segundo a qual “a correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”.
A relatora afirmou, ainda, que o magistrado, ao fixar o valor da indenização por dano moral, leva em consideração o tempo decorrido entre a data do evento danoso e o dia do arbitramento da indenização pecuniária. Por essas razões, considerou que a data fixada no acórdão proferido pelo tribunal paulista é que deveria ser o termo inicial dos juros de mora.
REsp 1132866
Comentário:
Sempre defendemos uma posição diversa, e nos processos procuramos destacar que os juros sobre o valor arbitrado devem incidir a partir da data em que são arbitrados, uma vez que são definidos no memento atual, e não quando da ocorrência do evento danos. Diferentemente ocorre com os juros relativos a outros valores, como danos a bens materiais ou pensão. Estes tem o seu valor claramente definido no momento da ocorrência. O Tribunal de Justiça de SC manifestou-se no mesmo sentido, em diversas ocasiões, muito embora não seja um posicionamento unânime. O seguinte acórdão é um bom exemplo, que abraça o nosso entendimento:
"Embargos de declaração. Ação de indenização por danos morais. Procedência do pedido e confirmação do decisum neste Tribunal. Omissão acerca do termo inicial dos juros moratórios. Matéria não suscitada em recurso de apelação. Possibilidade de pronunciamento de ofício, pelo julgador, a qualquer tempo. Acolhimento. Aplicação do novo entendimento adotado pela Câmara. Incidência dos juros de mora a partir da decisão que fixa o quantum indenizatório.
Em tema de indenização por danos morais, tanto a correção monetária quanto os juros de mora devem incidir a partir da data da decisão judicial que fixa o valor da reparação, pois que somente nesse momento temporal a obrigação tornou-se líquida e certa, não se podendo cogitar da existência de mora do réu-devedor antes de verificadas estas duas condições, sendo inadequado aplicar-se à espécie a Súmula 54, do Superior Tribunal de Justiça (TJSC, Ap. Cív. 2009.018696-7, de Capinzal, rel. Des. Newton Janke, j. 8/9/2009)" (n. 2009.024143-8, rel. Pedro Manoel Abreu, j. 11.1.11).
Nos casos que envolvem indenização securitária essa questão é de grande importância, tendo em vista as discussões que normalmente surgem quanto a cobertura de danos morais e sua correção, em especial quando o fato tenha ocorrido já há muitos anos atrás.
De qualquer modo, recomenda-se que pelo corretor de seguros seja oferecido ao Segurado uma cobertura sempre elevada, para evitar dissabores quando da definição de tal valor pelo Judiciário.
E, lembrando sempre que, em caso de recusa do segurado em incluir a cobertura de Danos Morais, deve ser obtida a sua anuência na proposta de seguro, ou em outro documento. Isso para que não seja dito, no futuro, pelo segurado, quando eventualmente condenado a indenizar por Danos Morais, que o corretor não tenha oferecido tal cobertura. Aliás, recomenda-se que em qualquer proposta de seguro conste a assinatura do segurado, para que a carga de responsabilidade pelos valores contratados (em especial os da cobertura de RCF) não recaia sobre os ombros do corretor.
Pelo teor do julgado do STJ, acima mencionado, ainda haverá muita discussão sobre esse tema.
Edson Passold (OAB/SC 5827)